Capítulo 19
Uma pequena visão da casa dos Sawada
A Flávia
andava tão distante de mim ultimamente, ou talvez seja apenas eu que tenha me
afastado, estava na cozinha fazendo o jantar para o meu pai, Kiriko, minha loba
branca, estava tentando tomar a comida das minhas mãos, eu realmente gostava
dela, mas ás vezes isso me irritava por que ela não podia ser simplesmente
igual ao Lambo, meu lobo de pelagem negra que estava deitado a um canto,
dormindo, ele era tão menos agitado que Kiriko.
– Calma!
Calma! – disse enfim perdendo a paciência com Kiriko – Eu já vou buscar sua
carne, mas essa é do papai ok?
Eu andava
realmente preocupada com o sangue de unicórnio, queria poder dividir com alguém
meu medo sobre o que aquilo poderia ser usado, mas a Flávia, minha amiga mais
próxima simplesmente tinha a cabeça cheia demais para se preocupar com aquilo,
eu até entendia, de um dia para o outro ela se tornara o centro do mundo, a
criação e a destruição em pessoa, e várias criaturas apareceram para ela, não
podia incomodá-la com algo como meu problema com os unicórnios, suava quase
infantil perto do dela.
Cheguei a mesa
do jantar, meu pai me encarou, tinha os cabelos castanhos e curtos, os olhos
azuis profundos e cansados das batalhas, e um corpo acima do peso, mas mesmo
que ás vezes fosse duro e não me deixasse fazer o que eu queria era o pai mais
gentil do mundo. Mas hoje seus olhos estavam carregados de preocupação.
– O que foi
Otou-san? – perguntei.
– Hoje fazem dois anos... – meu pai parecia
tão triste por dizer aquilo – Okami, eles não vão mais voltar.
Ao ouvir meu
pai dizer isso a ficha caiu, meus olhos se encheram de lágrimas, eles iam
voltar, com certeza iam!
– Claro que
vão! – mesmo sem querer alterei meu tom de voz – A Okaa-san e o Nii-chan são
muito, muito fortes, eles... – as palavras saiam com mais dificuldade pelas
lágrimas, mas toda vez que me lembrava do meu irmão e da minha mãe era quase
inevitável não chorar – com certeza eles... vão voltar!
O silêncio
que ficou entre mim e meu pai foi quebrado pela campainha, quem seria uma hora
daquela? Provavelmente a Flávia, mas esse pensamento me deixava preocupada,
será que havia acontecido algo com ela?!
Abri a porta
e vi um garoto de olhos azuis, eram mais alto e mais velho que eu, seus cabelos
eram vermelhos, e lindos! Aquele era... era...
–
Nii-chan!!! – gritei pulando em cima dele, as lágrimas voltaram a cair, mas
agora eu estava sendo invadida de pura alegria, meu irmão, meu irmão estava em
casa!
Meu pai logo
veio ver o porquê da barulheira, seus olhos se encheram de lágrimas assim como
os meus e ele correu em direção ao meu irmão.
– Sanji...
Sanji... é-é você? Você...
– Otou-san,
Okami-chan. Tadaima! – disse Sanji com um sorriso no rosto.
– Okaeri! –
disse com um sorriso de orelha a orelha.
Assim que
Sanji entrou olhei porta afora, esperava ver a mulher dos cabelos vermelhos e
longos, olhos castanhos, minha mãe, mas não havia mais ninguém atrás do Sanji.
Enquanto olhava porta afora senti uma mão em meu ombro, olhei para Sanji que
acenou tristemente em negativo. Ele sobrevivera... minha mãe não!
O jantar
passou, eu tinha tantas perguntas paro o Sanji, mas ele respondeu todas com
calme e alegria, era o meu irmão de sempre, alegre, espontâneo, brincalhão e
divertido. Eu me lembrei de quando éramos mais novos, quando ainda morávamos em
Portugal e ele ficava cantando a Flávia, era tão engraçado ver a cara dela de
surpresa, lembrar dos biscoitos da minha mãe, das broncas do meu pai quando eu,
a Flávia, o Sanji e a Jéssica fugíamos a noite para ver as estrelas do morro
que havia perto das nossas casas. Aquelas lembranças eram tão coloridas, tão
divertidas, mas com aquele clima tenso, coma a morte da minha mãe, aquelas
lembranças ganhavam um ar tão triste, tão nostálgico.
Fui para a
cama algumas horas mais tarde, mas não conseguia dormir, Kiriko e Lambo
pareciam sentir minha tristeza, pois subiram em minha cama e se enrolaram e
mim, como se me protegessem, abracei ambos com força, mas a dor não passava,
provavelmente nunca iria passar.
Doía lembrar
da minha mãe, saber que nunca mais ia vê-la, doía ter esperado dois anos para
receber a notícia de sua morte, mas principalmente, doía saber que a culpa era
minha!
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